Publicado por: marjoriematos | 29/05/2009

Os verdadeiros nomes de MG

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AFINAL, QUEM FOI TIRADENTES?
Considerado pela Coroa Portuguesa como o cabeça da conjuração Mineira, morto por enforcamento, Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, tornou-se herói nacional e uma das figuras mais polêmicas da nossa história. Muito tem-se falado dele, mas sabe-se pouco de sua vida. O que conhecemos dele encontra-se nos Autos de Devassa da Inconfidência Mineira (Publicado pela Imprensa Oficial, Belo Horizonte,1982) em alguns documentos. Mesmo assim, pela intensidade e pela trama em que se meteu nos últimos anos de vida, nos foi legado um envolvente material que nos permite não só polemizar, como discutir esta figura, até certo ponto enigmática de nossa história.
Portanto, para compreendermos quem foi Tiradentes e buscarmos algumas pistas de seu papel na Inconfidência Mineira, é necessário analisarmos os Autos como fonte e documentação históricas. Montados pelas autoridades portuguesas, eles representam o poder da época construindo fatos, escolhendo seus personagens e suas vítimas e mesmo protegendo determinadas figuras quando isso convinha. Desta forma, ao trabalharmos com os Autos, os utilizaremos como um documento/monumento que reflete os conflitos que marcaram uma época. Segundo Jacques Le Goff: “O documento é monumento. Resulta do esforço das sociedade históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente – determinada imagem de si próprias. No Limite, não existe um documento-verdade. Todo documento é mentira. Cabe ao historiador não fazer o papel de ingênuo”.(Documento/Momumento, Einaud, v.1, 1984, p.103)
Portanto, é a partir desse conceito, que devemos trabalhar com os Autos, não esquecendo que os presos encontravam-se incomunicáveis, sujeitos a toda forma de pressões psicológicas e torturas. Não é por acaso que o réu Francisco Antônio de Oliveira Lopes acusa o escrivão da Devassa, José Caetano César Manitti, de ter manipulado seu depoimento, que já chegou lavrado e que ele assinou sem nem ao menos ter lido. (Autos, v.4, p.275)
Em outro documento, conhecido como Exposição sobre a repressão e Julgamento dos réus da Inconfidência Mineira, atribuído a Francisco Gregório Pires Monteiro Bandeira, ex-Intendente de Vila Rica e amigo de Tomás Antônio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa, existe outra acusação ao escrivão Manitti: “… iludiu com promessa e insinuações; e, se algum resistia, com tratos. Dos sacerdotes, alguns foram encerrados em prisões tão escuras, úmidas, apertadas e fétida …”. (Autos, v.9, p.254)
Vejamos, então, como Tiradentes surge nos Autos, através de seus próprios depoimentos e de seus companheiros de conjuração. Nas suas três primeiras inquirições ele tanto nega o movimento como sua participação. Perguntado sobre o levante responde: “… que tal não há, que tudo é uma quimera, que ele não é pessoa, que tenha figura, nem valimento, nem riqueza, para poder persuadir um povo tão grande a semelhança asneira”. (Autos, v.9, p.254)
Assim, ele negou até a quarta inquirição quando, repentinamente e sem uma explicação plausível, confessa ser o cabeça da conjuração, assumindo toda a responsabilidade pela tentativa de levante em Minas Gerais. Foi a partir desta resposta que grande parte dos historiadores começam a forjar sua trajetória de herói: “…que ele até agora negou por querer encobrir a sua culpa, e não querer perder ninguém; porém que a vista das fortíssimas instâncias com que se vê atacado, e a que não pode responder corretamente senão faltando clara, e conhecidamente à verdade, se resolve a dizê-la, como ela é: que é verdade, que se premeditava o levante, que ele … confessa ter sido quem ideou tudo, sem que nenhuma outra pessoa o movesse, nem lhe inspirasse coisa alguma, e que tendo projetado o dito levante, o que fizera desesperado, por ter sido preterido quatro vezes, parecendo a ele …, que tinha sido muito exato no serviço, e que achando-o para as diligências mais arriscadas, para as promoções e aumento de postos achavam os outros, que só podiam campar por mais bonitos, ou por terem comadres …”. (Autos, v.5, p.36)
Em outro ponto da inquirição, insiste que não havia um cabeça, mas assume a responsabilidade de ser o primeiro a falar em conjuração: “que não havia cabeça algum, que o réu …fora sim o primeiro que falara na matéria conversando a respeito da derrama, os mais foram seguindo, e aprovando mas sem nenhum se fazer cabeça e na realidade sempre a coisa ficou como meio feito no ar …”. (Autos, v.5, p.44)
Entretanto, a sua participação surge em quase todos os interrogatórios dos demais envolvidos. A maioria revela um Tiradentes louco, falastrão, leviano, uma pessoa sem maior importância e caráter. O Coronel Alvarenga Peixoto afirma que o tenente-coronel Freire de Andrada, comandante da Tropa Paga de Minas Gerais, e também conspirador, insistia para que o ouvisse, pois: “fazia gosto que ouvisse ao dito Alferes Joaquim José, só por ver quanto inflamado na matéria, que chegava a chorar…”. (Autos, v.5, p.116)
Em outra passagem refere-se a seu aspecto físico: “Neste mesmo dia de tarde, estando … no escritório de João Rodrigues Macedo, lhe apareceu um oficial feio, espantado … “.(Auto, v.5, p.116)
Em um encontro entre Alvarenga e o Padre Oliveira Rolim, em que estava presente Tiradentes, após sua retirada, o próprio Alvarenga informa: “o dito padre disse a ele … que aquele rapaz era um herói, que se lhe não dava morrer na ação, contando que ela se fizesse …”. (Autos, v.5, p.121)
O próprio Padre Rolim fala de um outro Tiradentes, muito diferente do suposto “herói” de que nos dá notícia Alvarenga: “… porém como o mesmo alferes disse a ele …, em outra ocasião, que a alguns dizia que entravam várias pessoas a que ele não tinha falado nem sabia que entrassem, por isso ficou na dúvida, e ainda hoje está nela, de que o dito Desembargador entrasse …”. (Autos, v.5, p.348)
O Padre Toledo e Melo, outro envolvido na conspiração, fala de Tiradentes: “… O Alferes Joaquim José da Silva Xavier disse também, que ele queria para si a ação maior, e de maior risco nesta conjuração …”. (Autos, v.5, p.142)
É neste depoimento que aparece um Tiradentes que chama para si a ação de maior risco: ir a Cachoeira de Campo e cortar a cabeça do Governador Visconde de Barbacena.
O Cônego Luís Vieira, grande orador e entusiasta da Revolução Americana de 1776, menciona-o em seu interrogatório, dizendo: “… que o mesmo Alferes – Tiradentes – andava por Vila Rica por casa de várias meretrizes a prometer prêmios para o futuro quando se formasse um República …”. (Autos, v.5, p.243)
É nesse interrogatório que ele surge como um bêbado que vivia nas tabernas e casas de prostituição, prometendo absurdos para as pessoas, após a formação do novo governo. Assim, o Cônego sustenta a tese do louco que não podia ser levado em consideração.
Entretanto, os próprios juizes da Devassa desconfiavam que ele tivesse este conceito tão negativo em relação a Tiradentes. O que podemos constatar pelo teor de uma pergunta, que lhe foi feita: “… aí disse que o Alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha Tiradentes, era um homem animoso, e o abonou, e que se houvesse muitos como ele, seria o Brasil uma república florente” (Autos, v.5, p.243)
O depoimento de Vicente Vieira Mota, guarda-livros dos contratos do poderoso comerciante João Rodrigues de Macedo, é cheio de referências a Tiradentes. Para ele, o Alferes era um louco sem limites que falava publicamente sobre liberdade e a República que se pretendia instalar nas Minas Gerais: “… que já era mui público ele andar com aquelas loucuras, e despropósitos tanto naquela Vila, como nesta cidade do Rio de Janeiro … a que ele impaciente tornou, dizendo-lhe, o certo é que já não há homens; porém que havia de armar uma meada tal, que em dez, vinte, ou cem anos se não havia de desembaraçar …” (Autos, v.5, p.406-407)
Ainda para o guarda-livros, até o famoso médico de Vila Rica, Dr. Tomás de Aquino Belo e Freitas o considerava um louco ao falar em liberdade pelas tavernas da cidade: “(…) tanto assim, que em uma ocasião, segundo o seu parecer depois das prisões, o médico Belo, falando-se nas ditas prisões, dissera em sua casa, que o dito Alferes era tão louco, que até pelas tavernas andava falando em República e liberdade de Minas”. (Autos, v.5, p.409-410)
Porém, outros personagens vão se ocupar da figura de Tiradentes de uma maneira diferente, nos legando uma imagem até hoje aceita, e consolidada no nosso imaginário. 
São duas narrativas de frades franciscanos que testemunharam os momentos derradeiros dos inconfidentes: “Últimos momentos dos Inconfidentes de 1789, pelo frade que os assistiu em confissão”, de Frei Raimundo da Anunciação Penaforte, que, na província franciscana da Repartição Sul, ocupava o cargo de Custódio da Mesa, de 1792 e “Memórias do êxito que teve a conjuração de Minas e dos fatos relativos a ela acontecidos nesta cidade do Rio de Janeiro desde 17 até 26 de abril de 1792”, atribuída por Tarquínio J.B de Oliveira ao Frei José Carlos de Jesus do Desterro, guardião do convento de Santo Antônio.
Nestes testemunhos/narrativas vislumbramos as primeiras tentativas de formalizar, contemporaneamente, a memória histórica de Tiradentes e da Inconfidência Mineira. Elaboradas segundo o ideal e imaginário cristão, estão repletas, principalmente, de representações histórico-culturais destes autores.
Assim, Tiradentes torna-se modelo de cristão, generoso, arrependido, castigado, mas preparado para bem morrer. Segundo Frei Desterro, Tiradentes recebeu sereno e convencido da gravidade de seus pecados a sentença de condenação. Após a leitura do Decreto Régio, sua reação foi de alegria pelos outros réus que receberam o perdão real, e pouco trabalho tiveram seus confessores em seu consolo, pois já estava “humilhado e contrito, exercitando-se em muitos atos das principais virtudes” (Autos, v.9, p.108) 
Descreve sua caminhada para a forca, como se fosse o próprio Cristo: beija os pés e perdoa o carrasco; recebe a alva, despe a camisa e fala: “Nosso Senhor morreu nu por meus pecados …”; caminha com o crucifixo na mão, certo de “oferecer a morte como sacrifício a Deus”. (Autos, v.9, p.108)
Também Frei Raimundo Penaforte relata os momentos derradeiros de Tiradentes, descrevendo a cena com o carrasco e a preparação para a execução, traçando, também, seu perfil cristão: “Ligeiramente subiu os degraus; e sem levantar os olhos que sempre conservou pregados no crucifixo, sem estremecimento algum, deu lugar ao carrasco para preparar o que era necessário; e, por três vezes, pediu-lhe para abreviar a execução” (Autos. v.9, p.174)
Assim, os frades franciscanos nos legaram um Tiradentes arrependido de seus pecados e culpa, uma imagem idealizada segundo os princípios cristãos.
No final do período monárquico a vida histórica da Inconfidência Mineira é refeita. O acontecimento é acolhido através de novas reconstruções que lhe dão vida e, por sua vez, resgatam os valores presente, inevitáveis e necessários à perpetuação ou criação do passado histórico.
O marco historiográfico que coloca a Inconfidência Mineira novamente em evidência é o livro do monarquista Joaquim Norberto de Souza e Silva, História da Conjuração Mineira, de 1873. Em um trabalho de fôlego, quando pela primeira vez são utilizados os Autos e outros documentos importantes por ele descoberto, o autor não deixa transparecer que Tiradentes pudesse ser o líder do movimento. Na sua visão, ele não passava de uma pessoa leviana, aliciado pelos ideais libertários de Álvares Maciel. Apesar de considerá-lo tenaz e fogoso, não acreditava que tivesse condições, principalmente por sua falta de caráter, de ser o cabeça da conjuração. Ao contrário, a sua presença era muito mais nefasta do que benéfica para a causa do movimento.
Na vida ou na morte, Tiradentes não foi bem acolhido por Joaquim Norberto. Porém, delineia-se em sua obra o mesmo comportamento sereno e cristão traçado pelos frades franciscanos: “dirigiu como um mártir cristão brandas palavras repassadas em unção e de amor ao próximo ao padre que confortava dizendo que morria cheio de prazer”. (SILVA, v.2, p.203)
A sua imagem é propagada, permanecendo o homem cristão resignado e convicto da vida eterna. Porém, não é desta forma que Joaquim Norberto gostaria de vê-lo diante da morte. Para ele, esta não era uma morte digna de um herói, que não deveria morrer arrependido, contrito, humilde e conformado: “Morrera o Tiradentes, não como um grande patriota, com os olhos cravados no povo, tendo nos lábios os sagrados nomes da pátria e da liberdade … mas como cristão preparado há muito tempo pelos sacerdotes”. (SILVA, v.2, p.211)
O historiador José Murilo de Carvalho, em seu livro, A Formação das almas, nos mostra a busca republicana por um herói que representasse um mito de origem. Este foi Tiradentes, herói místico, que Joaquim Norberto delineou com o objetivo de desqualificá-lo por sua postura cristã, acabando por contribuir para sua mitificação. Para Carvalho, o êxito de Tiradentes estava na sua identificação com Cristo, passando pelos mesmos sacrifícios, tocando o sentimento popular. Portanto, os republicanos tomam a dianteira da apropriação de sua memória, uma vez que, segundo Carvalho: “a elaboração de um imaginário é parte da legitimação de qualquer regime político”. (CARVALHO, p.10)
Surge, então, a obra do historiador e pensador cristão, Lúcio José dos Santos, A Inconfidência Mineira – papel de Tiradentes na Inconfidência Mineira, de 1927. Suas idéias coincidem com a forma de pensar dos narradores religiosos do século XVIII. Ele resgata a figura de Tiradentes, colocando-o como o grande líder da Inconfidência Mineira. 
Assim, para Lúcio dos Santos, a grande lição histórica da Inconfidência foi a prova que Tiradentes deixou de dedicação religiosa e de sacrifício. Acreditava que “quem é incapaz de sacrifício, é incapaz de amar, é incapaz de patriotismo”. (SANTOS, p.29)
A tentativa de deixar para os futuros leitores a imagem de mártir em sintonia com os ideais religiosos não foi em vão. Os resultados, encontramos na própria historiografia da Inconfidência, no Tiradentes dos monumentos e obras de arte e finalmente como parte do nosso imaginário mítico.
O movimento sobrevive no tempo. As obras historiográficas, que utilizam os Autos e as narrativas como fonte histórica, constituíram a sobrevida necessária para que a Inconfidência Mineira não permanecesse no esquecimento.
Vários cronistas, estudiosos, historiadores, poetas e compositores escreveram sobre Tiradentes e seu ideal de liberdade: Cecília Meireles, no Romanceiro da Inconfidência, exalta o “animoso Alferes” (p.79), o historiador Francisco Iglésias falou da generosidade e do símbolo do homem livre, “com o sentido de dignidade da pátria e do cidadão” (Minas de Liberdade, p.25); para o compositor Fernando Brant, o corpo espalhado em quatro cantos “são sonhos que nos alimentam de vida e de esperança” (Idem, p.31); o sociólogo Herbert de Souza, o Betinho, diz que “o sonho de liberdade não morre, mesmo quando esquartejada, e que o futuro tem gosto de Tiradentes” (Idem, p.39); o escritor e jornalista Zuenir Ventura, com os olhos no presente, afirma ” que hoje ele não se conformaria: iria lutar também pela cidadania – ainda que tardia” (Idem, p.63), e o cronista e romancista Otto Lara Resende fala com intimidade de um rapaz meio maluco e sonhador: “A chama que ele acendeu não pode se apagar, mas sempre corre perigo. A utopia do Tiradentes continua por isso atualíssima. Ela cabe numa palavra – Liberdade”. (Idem, p.91)
O brasilianista Kenneth Maxwell, em seu livro A Devassa da Devassa sugere que Tiradentes foi o bode expiatório escolhido pelas autoridades portuguesas: “Não era influente, não tinha importantes ligações de família, era um solteirão que passava a maior parte de sua vida à sombra de protetores mais ricos e bem-sucedidos”. (MAXWELL, p.215-216)
Para ele Tiradentes era um homem cheio de ressentimentos, ambicioso, lutando por uma ascensão social dentro da estrutura implantada pela coroa portuguesa. Assim, afirma que: “Era óbvia a sedução que o enforcamento do alferes representava para o governo português: pouca gente levaria a sério um movimento chefiado por um simples Tiradentes…”. (MAXWELL, p.216)
Resta-nos a pergunta: Afinal, quem foi Tiradentes? Apesar de tudo que se tem escrito e falado, sabemos muito pouco de sua vida. Ainda estamos presos aos Autos – o documento-monumento montado pelo poder e saber de uma época – para levantarmos algumas hipóteses em relação a sua figura e ao seu papel na Inconfidência Mineira. 
Possivelmente, sua função fosse a de atrair e seduzir novos elementos para o levante. Era o aliciador que circulava por todos os lugares e no meio do povo. Ele próprio em um de seus interrogatórios nos fornece uma pista: “Em conseqüência do ajuste. De que ele … capacitasse, e seduzisse as pessoas que pudesse, para entrar na sublevação, e motim, procurou ele …falar a algumas pessoas, usando da arte, que lhe parecia necessária conforme caracteres delas, e aproveitando as ocasiões, que se lhe ofereciam para isso …”. (Autos, v.5, p.37-38)
Além do mais, vários dos envolvidos na conspiração declararam que foram convidados por ele para tomarem parte na sedição que se preparava. O tenente coronel Francisco de Paula Freire de Andrada afirma: “Que a primeira pessoa que lhe falou na matéria do levante, e conjuração, que se premeditava fazer na Capitania de Minas Gerais, foi o Alferes Joaquim José da Silva Xavier…”. (Auto, v.5, p.180)
José Álvares de Maciel, jovem estudante que acabara de chegar da Europa cheio de idéias novas, diz “… que a primeira vez que ouviu a má proposição, de que a Capitania de Minas Gerais havia de ser independente e livre, foi ao Alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha – o Tiradentes – …”. (Autos, v.5, p.327)
O Padre Manuel Rodrigues da Costa, também, revela suas conversações com o Alferes: “…se lembra que o mesmo alferes lhe falou em que havia de falar a alguns soldados, e oficiais para aquilo mesmo”. (Autos, v.5, p. 490)
Sabemos que a maioria dos indiciados tentou incriminá-lo. Se foi Tiradentes o cabeça da conjuração, não se pode afirmar com certeza. Porém, por força de ofício, sabemos que ele circulou com bastante desenvoltura e, por onde passava, exercendo a arte de falar, propagava a conjuração. Contudo, sua imagem foi cuidadosamente e deliberadamente trabalhada pelos frades franciscanos e, mais tarde, apropriada pelos republicanos em busca da legitimação do novo regime. O resto ficou por conta da historiografia, dos políticos, dos poetas, dos cronistas, dos romancistas, dos artistas, dos estudiosos, enfim, das paixões humanas, que o transformaram em mito de origem do nosso ideal de liberdade.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AUTOS DE DEVASSA da Inconfidência Mineira. Belo Horizonte, Imprensa Oficial de Minas Gerais, v. 1-9, 1976.
CARVALHO, José Murilo. A Formação das Almas: o imaginário da República no Brasil. São Paulo: Cia da Letras, 1990.
LE GOFF, Jacques. Documento/Monumento. Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1984.v.1. p.103.
MAXWEEL, Kenneth. A devassa da Devassa – A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal 1750-1808. 3ª ed, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
MINAS de Liberdade. Belo Horizonte: Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais/Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, 1992.
SANTOS, Lúcio José dos. A inconfidência Mineira: Papel de Tiradentes na Inconfidência Mineira. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1972.
SILVA, Joaquim Norberto de Souza. História da Conjuração Mineira. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1948.

 

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SANTOS DUMONT E A INVENÇÃO DO AVIÃO 

Alberto Santos Dumont foi o maior inventor brasileiro de todos os tempos e, também, aquele que contou com mais recursos à sua disposição para realizar seus experimentos. Filho de um grande fazendeiro de café, Dumont recebeu uma grande herança do pai, suficiente para financiar seus inventos e garantir sua subsistência ao longo de toda a vida. De seus inventos nunca recebeu nada, recusando-se a solicitar patentes de seus aparelhos por julgar que o segredo de invenção retardava o desenvolvimento aeronáutico. 

Alberto Santos Dumont foi o maior inventor brasileiro de todos os tempos e, também, aquele que contou com mais recursos à sua disposição para realizar seus experimentos. Filho de um grande fazendeiro de café, Dumont recebeu uma grande herança do pai, suficiente para financiar seus inventos e garantir sua subsistência ao longo de toda a vida. De seus inventos nunca recebeu nada, recusando-se a solicitar patentes de seus aparelhos por julgar que o segredo de invenção retardava o desenvolvimento aeronáutico. 
Durante alguns dias, Dumont realizou diversos experimentos com o 14 Bis.
Em 13 de setembro de 1906, diante de testemunhas, ele realizava seu histórico vôo 
Nessa época, o inventor brasileiro já se convencera de que o motor de explosão tinha se desenvolvido o suficiente para sua aplicação na construção de uma aeronave mais pesada do que o ar. E assim abandonou os balões e dirigíveis e concentrou-se nos estudos de um aparelho dessa natureza. Em 1906, a aeronave estava pronta. Tinha 10 metros de comprimento , 12 de envergadura e pesava 160 quilos, contando com um motor de 50 cavalos de força. No dia 13 de setembro de 1906, Dumont realizava o primeiro vôo do 14 Bis . Diante de numerosa comissão fiscalizadora do Aeroclube da França, no campo de Bagatelle, o avião correu por cerca de 200 metros e alcançou vôo, descrevendo um percurso de cerca de 100 metros, a mais de um metro de altura. Era a primeira vez que um aparelho mais pesado que o ar se elevava por seus próprios meios e permanecia no ar por algum tempo. A fama de Dumont espalhou-se rapidamente por vários países da europeus. 
O aparelho Demoseille, projetado e construído por Santos Dumont, seria hoje chamada de aeronave ultra-leve. Com ela Dumont realizava viagens freqüentes no interior da França.
Em 1907, Dumont construiu um avião sensivelmente mais evoluído do que o primeiro: voava a aeronave Nº 19,batizada pelo povo de Paris como “Demoiselle”. O aparelho possuía apenas 8,4 metros de comprimento e 5,10 cm de envergadura e se assentava sobre três rodas, duas na parte traseira do avião e uma na frente. A fuselagem era construída de longarinas de bambucom juntas demetal e as asas cobertas de seda japonesa. O motor de 30 cavalos tinha sido concebido pelo próprio Dumont e pesava 40 quilos. Com esse avião, pioneiramente, Dumont realizou viagens orientadas por bússola. O aparelho voava a 80 quilômetros por hora. 
O Demoiselle era um aparelho leve, de grande efeito estético.Pousava e decolava em apenas 80 metros de terreno gramado. 
Dumont realizava vôos freqüentes com o aparelho sobre Paris e algumas pequenas navegações para locais próximos. 
A volta ao Brasil
De volta ao país, Dumont tentou ser ouvido sobre a implantação da aviação no Brasil, mas o resultado foi frustrante. Depois de constatar o interesse que demonstravam pela aeronáutica diversos países, também, inconformado com a falta e importância que lhe era atribuída, entre nós, Dumont escreveu ao presidente da República. Na carta, datada de 16 de novembro de 1917, afirmava que a aviação já era reconhecida como uma das principais armas de guerra, que o Congresso norte-americano acabara de ordenar a construção de 22.000 aparelhos e que tanto a Argentina, como o Chile já possuíam uma grande frota aérea, enquanto o Brasil não dava atenção ao problema. A resposta à carta foi negativa, e Dumont, decepcionado, tornou-a pública, queixando-se de que sua opinião parecia menos valiosa para brasileiros do que para os americanos e chilenos. 
Mas se ele revelava preocupação de que o Brasil fosse dotado de uma força aérea, não defendia a fabricação local. Ao contrário, Dumont acreditava que os aviões deveriam ser encomendados “às melhores casas européias e americanas”, cujos tipos já tinham sido “consagrados pelas experiências na guerra”. 
Por outro lado, Dumont lembrava que os precursores da aeronáutica na França, seus contemporâneos, eram então os homens que estavam à frente da indústria ou da implantação dos projetos fabris. O mesmo aconteceria na indústria automobilística, com Renault e outros à frente. Para ele, isso acontecia porque “seus governos os têm sabido aproveitar. 
Mas em 1917 o Governo tinha pouca vontade de se ocupar com a aviação, embora diversos governos brasileiros dessa época reconhecessem a importância do inventor, homenageando-o em várias ocasiões. 
Em 1918, ele recebeu o sítio Cabangu, onde nascera, como doação do Governo em reconhecimento por seus feitos. Dumont adquiriu terras contíguas, formou pastos, construiu um açude e começou a criar gado. 
Entretanto, ao reconhecimento internacional pela importância de seu invento, sucederam-se anos de sofrimento: quando o inventor tinha menos quarenta anos, uma terrível doença havia manifestava seus primeiros sintomas. Dumont foi acometido de esclerose múltipla. A doença, degenerativa e progressiva, logo o impediu de voar e Dumont passou vários anos vivendo entre o Brasil e a Europa, e sofrendo várias internações para tratamento dos sintomas da doença e alternando períodos de depressão e de vida relativamente normal .
Em 3 de dezembro de 1928, Dumont voltava de mais uma temporada na Europa. Ao mesmo tempo em que o navio em que viajava se preparava para aportar, já no interior da Baía da Guanabara, um hidroavião com vários passageiros a bordo realizava manobras com o objetivo de lançar sobre o navio uma mensagem de boas vindas ao inventor. No entanto, subitamente, aparentemente em razão de uma manobra equivocada, o avião caiu no mar, matando todos os seus ocupantes. O acidente provocou grande e prolongada depressão no inventor, que presenciou a queda da aeronave. 
Em meados de 1931, Dumont está de volta novamente ao Brasil, depois de outra temporada no estrangeiro. A doença progredira muito e o inventor tinha grandes dificuldades de locomoção e muitos períodos de melancolia. Vai então morar no Guarujá, onde caminhadas matinais na praia são seus últimos momentos de bem estar. 
Mas em 1932 irrompe a Revolução Constitucionalista. Em 14 de julho desse ano Dumont redige um manifesto conclamando os mineiros a se unir a São Paulo contra o Governo de Getúlio Vargas.
Na manhã de 23 julho de 1932, duas semanas depois de iniciada a guerra civil, Dumont presencia vôos rasantes de aeronaves do Exército e ouve bombas explodindo ao longe. Logo depois, tomado por uma profunda crise depressiva, o inventor enforcava-se no quarto do hotel em que vivia. 
Desaparecia, aos cinquenta e nove anos de idade, o inventor do avião. 

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O governo desenvolvimentista 

O governo de JK é lembrado como de grande desenvolvimento, incentivando o progresso econômico do país por meio da industrialização. Ao assumir sua candidatura, ele se comprometeu a trazer o desenvolvimento de forma absoluta para o Brasil, realizando 50 anos de progresso em apenas cinco de governo, o famoso “50 em 5”. 

Seu mandato foi marcado por grande calmaria política, sofrendo apenas dois movimentos de contestação por medo das tendências esquerdistas do presidente: as revoltas militares de Jacareacanga, em fevereiro de 1956 e de Aragarças, em dezembro de 1959. As duas contaram com pequeno número de insatisfeitos, sendo ambas reprimidas pelas Forças Armadas. Com o fim das revoltas, Juscelino concedeu “anistia ampla e irrestrita” a todos os envolvidos nos acontecimentos. 

O governo JK foi marcado por grandes obras e mudanças. As principais foram: 

– O Plano de Metas, que estabelecia 31 objetivos para serem cumpridos durante seu mandato, otimizando principalmente os setores de energia e transporte (com 70% do orçamento), indústrias de base, educação e alimentação. Os dois últimos não foram alcançados, mas isso passou despercebido diante de tantas melhorias proporcionadas por JK; 

– Criação do Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA), implantando várias indústrias de automóvel no país; 

– Criação do Conselho Nacional de Energia Nuclear; 

– Expansão das usinas hidrelétricas para obtenção de energia elétrica, com a construção da Usina de Paulo Afonso, no Rio São Francisco, na Bahia e das barragens de Furnas e Três Marias; 

– Criação do Grupo Executivo da Indústria de Construção Naval (Geicon); 

– Abertura de novas rodovias, como a Belém-Brasília, unindo regiões até então isoladas entre si; 

– Criação do Ministério das Minas e Energia, expandindo a indústria do aço; 

– Criação da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e 

– Fundação de Brasília. 

Durante esse governo houve um grande avanço industrial e a sua força motriz estava concentrada nas indústrias de base e na fabricação de bens de consumo duráveis e não-duráveis. O governo atraiu o investimento de capital estrangeiro no país incentivando a instalação de empresas internacionais, principalmente as automobilísticas. 

Essa política desenvolvimentista só foi possível por meio de duas realizações de Vargas: a Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda (RJ), em 1946 e a Petrobras, em 1953. Com a criação da Siderúrgica, o Brasil pôde começar a produzir chapas de ferro e laminados de aço, necessários como material para outras indústrias na fabricação de ferramentas, pregos, eletrodomésticos, motores, navios, automóveis e aviões. 

A Siderúrgica impulsionou a indústria automobilística que, por sua vez, impulsionou a indústria de peças e equipamentos. As três juntas impulsionaram o crescimento e a construção de usinas hidrelétricas mais potentes. A criação da Petrobras também forneceu matéria-prima para o desenvolvimento da indústria de derivados do petróleo, como plásticos, tintas, asfalto, fertilizantes e borracha sintética. 

Todo esse desenvolvimento concentrou-se no Sudeste brasileiro, enquanto as outras regiões continuavam com suas atividades econômicas tradicionais. Por esse motivo, as correntes migratórias aumentaram, sobretudo as do Nordeste para o Sudeste – que chegaram a 600 mil pessoas em 1953, o que significava 5% da população nordestina – e do campo para a cidade. 

Os bens produzidos pelas indústrias eram acessíveis apenas a uma pequena parcela de brasileiros, enquanto que a maioria – formada pela classe trabalhadora – continuava política e economicamente marginalizada,prova  cabal da concentração de riquezas nas mãos de poucos. 

Para tentar sanar esse problema, JK criou a Sudene, em 1959, para promover o desenvolvimento do Nordeste. A intenção era que houvesse industrialização e agricultura irrigada na região. Porém, o seu partido, o PSD, era ligado aos coronéis do interior, o que impediu que a Sudene fosse um instrumento da prática da Reforma Agrária na região, solução decisiva para acabar com as desigualdades sociais. 

Além desses problemas, o progresso econômico também gerou muitas dívidas. Apesar de o Produto Interno Bruto – PIB – ter crescido 7% ao ano e da taxa de renda per capita ter aumentado num ritmo quatro vezes maior do que o da América Latina, as exportações não atingiram o mesmo valor do endividamento e JK foi se enforcando com a própria corda. O capital estrangeiro que trazia riquezas ao Brasil era o mesmo que lhe cobrava montanhas de juros pelos empréstimos realizados pelos Estados Unidos. Nessa época a taxa de inflação crescia sem parar e a moeda brasileira estava cada vez mais desvalorizada. 

A sorte de Juscelino foi que esses problemas só vieram à tona quando seu mandato estava bem perto do fim, e isto não abalou a sua imagem diante da população, que até hoje o considera como um político visionário e de grande responsabilidade pelo desenvolvimento do país. 

Brasília 

A fundação de Brasília como nova capital do país, em localização estratégica, criou uma metrópole no interior do território nacional. Até 1950 existia uma idéia de que existiam dois “Brasis”: um litorâneo, produtivo e moderno e outro interiorano, estagnado social e economicamente. Brasília serviria para permitir a interiorização do desenvolvimento. A Novacap, empresa responsável pela construção de Brasília, atraiu mais de 3 mil operários para o centro do país. 

Conhecidos como “candangos”, estes homens trabalhavam sem parar, noite e dia. No dia de sua inauguração, em 21 de Abril de 1960, a nova capital contou com a presença de mais de 100 mil visitantes que puderam ver o nascimento de um dos principais símbolos arquitetônicos do mundo, idealizado pelo renomado arquiteto Oscar Niemeyer.


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